Baldur’s Gate 3: Analisando o sucesso do RPG de Dungeons and Dragons

Baldur’s Gate 3 segue obtendo enorme sucesso, e assim questionamos os fatores do RPG de Dungeons and Dragons que levaram a isso.
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Trailer oficial de Baldur’s Gate 3.

Baldur’s Gate 3 é um fenômeno absoluto, não apenas no gênero RPG e entre derivados de Dungeons and Dragons, mas em toda a indústria de games. Embora muitos esperassem que o sucesso fosse momentâneo, o jogo continua apresentando um ótimo desempenho mesmo 9 meses depois de seu lançamento. Dessa forma, analisar este sucesso pode ser um ótimo exercício para entender o mercado e a demanda dos jogadores.

Dungeons and Dragons da Bioware: O Início da Série Baldur’s Gate

Trailer da Enhanced Edition do primeiro Baldur’s Gate.

Mas, para começo de conversa, o que é o Baldur’s Gate 3? Para entendermos, precisamos voltar um pouco no tempo. Mais precisamente, para 30 de novembro de 1998, quando o primeiro Baldur’s Gate foi lançado. Desenvolvido pela então novata Bioware, o jogo foi o primeiro a trazer o universo do popular RPG de mesa Dungeons and Dragons (D&D) para os computadores modernos.

Anteriormente, diversos jogos baseados na propriedade intelectual já tinham obtido sucesso, como Eye of the Beholder no DOS e Pool of Radiance no Nintendinho. Entretanto, nenhum deles se comparava ao nível de complexidade de Baldur’s Gate, o primeiro título da franquia a chegar ao sistema Windows. Não é à toa que este foi o título que colocou o nome da Bioware no mapa da indústria de jogos.

Baldur’s Gate foi um RPG de visão isométrica que se passava em grande parte na cidade de mesmo nome. O jogo acompanhava o personagem criado pelo jogador, também chamado de Bhaalspawn, em sua luta contra as forças do mal. Entretanto, seu diferencial estava na possibilidade do jogador fazer suas próprias escolhas que moldariam a história. Além disso, o jogador encontrava diversos personagens durante sua aventura que poderiam se unir ao seu grupo.

O jogo foi um grande sucesso e revolucionou o gênero de RPGs devido ao seu escopo e profundidade. Além disso, inspirou diversos jogos no mesmo estilo, os quais futuramente seriam classificados como CRPGs, nome que anteriormente era utilizado para diferenciar RPGs para computadores dos RPGs de mesa.

Entretanto, um dos pontos altos de Baldur’s Gate era também um fator que limitava sua popularidade. Ao se basear em Dungeons and Dragons, Baldur’s Gate adaptou de forma bastante direta os sistemas de combate do RPG de mesa. Assim, ao mesmo tempo que trazia um sistema robusto com variedade incrível de possibilidades, também afastava muitos jogadores frustrados com suas complexidades.

Além disso, Baldur’s Gate também teve o azar de ser produzido quando Dungeons and Dragons estava em sua segunda edição, que tinha na base de suas regras o sistema THAC0. Este sistema é considerado extremamente contraintuitivo, devido ao fato de que ao equipar itens nos personagens, seus pontos de habilidade de defesa diminuem, podendo até ficar negativos. No contexto do sistema, números menores de defesa são melhores, mas, intuitivamente, os jogadores tendem a interpretá-los como piores.

Expandindo a franquia: Baldur’s Gate 2 e spin-offs

Trailer da Enhanced Edition do segundo Baldur’s Gate.

Ainda assim, os pontos positivos superaram os problemas de acessibilidade, e o sucesso do jogo, com mais de 2 milhões de cópias vendidas, levou a Bioware a desenvolver uma sequência para o título. Baldur’s Gate 2: Shadows of Amn foi lançado em 24 de setembro de 2000, continuando a história do Bhaalspawn, e melhorando absolutamente todos os aspectos do seu predecessor.

Até hoje, Baldur’s Gate 2 é considerado por muitos como um dos melhores jogos já lançados, sendo um sucesso de críticas, com grande destaque para sua história. Além disso, o jogo também foi muito aclamado como sequência, construindo em cima do que o jogo anterior havia estabelecido e levando os jogadores para novos e maiores desafios. Baldur’s Gate 2 acabou vendendo um número próximo de cópias do seu antecessor.

Dado o sucesso da série, seria óbvio esperar o lançamento de um terceiro jogo. Entretanto, a Bioware encerrou a história que queria contar com uma expansão para o segundo jogo, intitulada Throne of Bhaal. Depois disso, o estúdio até desenvolveu mais um jogo baseado em Dungeons and Dragons, chamado Neverwinter Nights, que obteve sucesso devido às ferramentas para criações dos jogadores, mas não quis voltar para a série Baldur’s Gate.

Neverwinter Nights foi o último jogo de Dungeons and Dragons da Bioware.

Dois spin-offs da série ainda seriam lançados logo depois de Baldur’s Gate 2. Estes foram Baldur’s Gate Dark Alliance 1 e 2, lançados para consoles, e desenvolvidos respectivamente pelos estúdios Snowblind e Black Isle. Contudo, sua jogabilidade era extremamente diferente dos jogos principais, assemelhando-se mais à série Diablo.

Enfim, a Bioware seguiu para seu jogo de Star Wars, Knights of the Old Republic, e, por fim, decidiu iniciar suas próprias propriedades intelectuais. Com isso, o estúdio desenvolveu Dragon Age, RPG de fantasia com mecânicas que lembram Baldur’s Gate, e também Mass Effect. Ambos se tornaram grandes títulos da indústria e elevaram ainda mais o patamar da Bioware, mas ficou claro que o estúdio não pretendia nunca mais dar continuidade a Baldur’s Gate.

Buscando o sucessor da Bioware: Black Isle e The Black Hound

Arte conceitual de Baldur's Gate 3: The Black Hound
Arte conceitual de Baldur’s Gate 3: The Black Hound – Foto: The Internet Archive

Mesmo assim, a Wizards of the Coast, empresa responsável por Dungeons and Dragons, ainda queria uma sequência para a série devido ao seu sucesso. Foi assim que o estúdio Black Isle foi escolhido para desenvolver o novo título. O estúdio já possuía reconhecimento por ter desenvolvido Planescape Torment e a franquia Icewind Dale, também pertencentes à marca Dungeons and Dragons, além de ter criado a franquia Fallout.

Dessa forma, a Black Isle iniciou o desenvolvimento do chamado Baldur’s Gate 3: The Black Hound. O jogo seria o primeiro da série a não utilizar o motor de jogo Infinity Engine, optando por revolucionar a franquia com um motor de gráficos tridimensionais. Além disso, o jogo adotaria a terceira edição do sistema Dungeons and Dragons, assim como Icewind Dale 2 e Neverwinter Nights já haviam feito. Quanto à história, o jogo prometia iniciar uma nova trilogia. Dessa forma, não traria nenhum dos personagens dos seus antecessores.

Infelizmente, após dois anos de desenvolvimento, The Black Hound acabou sendo cancelado devido a diversos problemas de licenciamento. A Interplay, que era a empresa mãe da Black Isle, foi processada pela Snowblind pelo uso indevido do motor de jogo do primeiro Dark Alliance no seu sucessor. A partir disso, a empresa perdeu a licença para publicar jogos de Dungeons and Dragons para consoles, onde Dark Alliance 2 seria lançado.

Entretanto, Dark Alliance 2 já estava finalizado, e a Interplay acreditava que ele venderia muito mais que The Black Hound. Dessa forma, a empresa negociou com a Wizards of the Coast para manter a licença para consoles em troca de perder a licença para PCs. Isso resultou no cancelamento de The Black Hound, mesmo com seu estado avançado de desenvolvimento.

A Interplay sacrificou The Black Hound para lançar Dark Alliance 2.

No fim das contas, as decisões da Interplay acabaram sendo prejudiciais, com Dark Alliance 2 vendendo muito menos que o esperado. Com isso, a empresa fechou o estúdio Black Isle, encerrando de vez as chances de The Black Hound ser finalizado.

Ainda assim, alguma esperança renasceu quando diversos ex-funcionários da Black Isle se juntaram para fundar a Obsidian Entertainment. O estúdio até chegou a desenvolver duas sequências de jogos da Bioware,  Star Wars Knights of the Old Republic 2 e Neverwinter Nights 2. Entretanto, nunca chegou a tocar em Baldur’s Gate 3, recusando em 2009 uma proposta da Atari, então dona da licença, para reviver o título.

Morte e Renascimento dos CRPGs: O Caminho para Baldur’s Gate 3

Neverwinter Nights 2, de 2006, é considerado um dos últimos CRPGs clássicos.

Um dos principais motivos para a dificuldade de produzir o terceiro Baldur’s Gate estava na rápida queda de popularidade do gênero de CRPGs. Primariamente, eles funcionavam melhor no computador, com uso de mouse e teclado, devido à complexidade do gameplay. Entretanto, a enorme popularidade dos consoles de sétima geração a partir de 2005 tirou muito espaço do computador como plataforma de jogos. Assim, RPGs de ação, com jogabilidade mais adequada para comandos de controle, começaram a substituir os CRPGs.

Além disso, com a evolução da tecnologia, RPGs com grandes e imersivos mundos 3D foram ganhando popularidade, como é o caso da série The Elder Scrolls. Com esse maior apelo gráfico, CRPGs se tornaram inviáveis devido ao seu escopo e complexidade, que necessitaria de orçamentos colossais para conciliar com gráficos realistas. E, é claro, nenhuma publisher queria arriscar tanto dinheiro em um gênero cada vez menos popular.

Foi com isso que muitos entusiastas dos jogos decretaram a morte do gênero dos CRPGs, e, por conseguinte, o fim da série Baldur’s Gate. Porém, essa declaração se mostrou prematura, pois, com o início da década de 2010, o cenário da indústria começou a mudar.

Primeiramente, houve a ascensão dos jogos de estúdios independentes, também conhecidos como jogos indie. Isso ocorreu graças à maior acessibilidade de ferramentas de criação de jogos em conjunto com o espaço de publicação de jogos indie oferecido pelas plataformas Steam e Xbox Live Arcade.

Além disso, o sucesso de plataformas de financiamento coletivo como Kickstarter permitiu que tanto estúdios independentes quanto estúdios com pouco investimento obtivessem o capital inicial para desenvolver jogos nichados. Ainda como um bônus, estas plataformas também funcionavam como uma métrica inicial do interesse existente do público no projeto.

A partir destes fatores, se iniciou o que muitos chamaram de “renascimento dos CRPGs”, com três grandes campanhas de financiamento de CRPGs lançadas em 2012. A primeira, em fevereiro, foi de Wasteland 2, sequência do jogo de 1988 da Interplay considerado como o predecessor da série Fallout. Já em abril, foi lançada a campanha de Shadowrun Returns, jogo baseado no RPG de mesa Shadowrun. Por fim, em setembro, a Obsidian lançou a campanha de financiamento de Pillars of Eternity, uma nova propriedade que traria jogabilidade baseada nos antigos jogos de Dungeons and Dragons, incluindo Baldur’s Gate.

Muitos consideram Wastelands 2 o responsável pelo renascimento dos CRPGs.

As três campanhas não só alcançaram os valores desejados, como também obtiveram muito mais do que o esperado, demonstrando claro interesse no gênero. Para Wasteland 2, o objetivo era arrecadar US$ 1 milhão, mas o valor total arrecadado ao fim foi quase o triplo disso, US$ 2,9 milhões. Enquanto isso, Shadowrun Returns pretendia conseguir US$ 400.000, e obteve mais que o quádruplo com US$ 1,8 milhões arrecadados. Pillars of Eternity, finalmente, visualizava um valor desejado de US$ 1,1 milhões, mas mostrou a força do nome Obsidian ao arrecadar US$ 3,9 milhões e se tornar a maior campanha de financiamento de jogos no Kickstarter até então.

Ainda em 2012, uma versão remasterizada do primeiro Baldur’s Gate foi lançada pela Beamdog, um novo estúdio criado pelo cofundador da Bioware, Trent Oster, e seu principal programador, Cameron Tofer. Embora o sucesso dessa remasterização tenha sido modesto, ela também serviu para demonstrar que ainda existia interesse na série, além de reiniciar discussões sobre a possibilidade do desenvolvimento de Baldur’s Gate 3.

Possibilidade revivida: A luta pelo desenvolvimento de BG3

Pillars of Eternity da Obsidian se inspirou nos antigos Baldurs Gate.

Com o sucesso do renascimento do gênero, alguns estúdios voltaram a demonstrar interesse no desenvolvimento de Baldur’s Gate 3. Entre eles, a inXile Entertainment, que desenvolveu Wasteland 2, e a Beamdog, que seguiu lançando remasterizações de diversos jogos de Dungeons and Dragons, incluindo Baldur’s Gate 2. Além disso, muitos fãs da série argumentavam que a Obsidian deveria ter o direito de concluir The Black Hound por ser a sucessora da Black Isle.

Um estúdio relativamente desconhecido também se candidatou para desenvolver o jogo. O estúdio belga Larian havia recém entrado na onda do renascimento de CRPGs ao reviver sua série Divinity, que havia iniciado em 2002 como uma mistura de Baldur’s Gate com Diablo.

Divinity: Original Sin foi lançado em 2014 após o sucesso de sua campanha de financiamento no ano anterior, e foi muito bem recebido em sua abordagem de CRPG com batalhas por turnos. A partir disso, o estúdio contatou a Wizards of the Coast sobre a possibilidade de desenvolver uma sequência para Baldur’s Gate.

Divinity: Original Sin colocou a Larian no mapa da nova era de CRPGs.

Entretanto, mesmo com o renascimento do gênero e o interesse dos diversos estúdios, a Wizards of the Coast ainda não estava convencida quanto ao desenvolvimento de Baldur’s Gate 3. Para a empresa, o público-alvo do gênero ainda era um pequeno nicho, não justificando, assim, o alto orçamento que seria necessário para o seu desenvolvimento.

Ainda assim, a Wizards testou as águas para a série ao permitir que a Beamdog desenvolvesse uma expansão para a versão remasterizada do primeiro Baldur’s Gate, que foi lançada em 2016 com o nome Siege of Dragonspear.

Além disso, a popularidade do RPG de mesa estava mais alta que nunca, devido a fatores como o sucesso do lançamento de sua quinta versão em 2014, que aumentou a acessibilidade ao diminuir muito a complexidade de suas regras. Houve também a exposição trazida pelo sucesso de Critical Role, um podcast de dubladores americanos jogando Dungeons and Dragons ao vivo que começou em 2015, e a série Stranger Things da Netflix, que iniciou em 2016 e trouxe os personagens jogando o RPG diversas vezes, além de basear seus vilões em inimigos do RPG.

Critical Role foi um dos principais difusores de Dungeons and Dragons.

Foi assim que isso tudo se alinhou com o desenvolvimento da sequência do jogo da Larian, Divinity: Original Sin 2, que obteve sucesso no financiamento em 2015. Desta vez, a Larian adotou uma estratégia de desenvolvimento diferente, lançando uma versão inicial do jogo no acesso antecipado da Steam em 2016. Esta versão possuía apenas o primeiro ato da história disponível, e serviu como um beta para teste dos jogadores que quisessem ajudar no desenvolvimento do jogo. Este durou cerca de um ano, com o jogo finalmente sendo lançado em 2017.

Divinity: Original Sin 2 foi um sucesso absoluto, vendendo três vezes mais que seu antecessor, em um total de 7,5 milhões de cópias até 2019. O enorme sucesso do jogo, seu escopo e seu modelo de desenvolvimento chamaram a atenção da Wizards of the Coast, que, lembrando do contato anterior da Larian, chamou a desenvolvedora para negociar o desenvolvimento de um novo jogo com a licença de Dungeons and Dragons.

O sucesso de Divinity: Original Sin 2 chamou a atenção da Wizards of the Coast.

Com isso, em junho de 2019, durante a E3, a Larian anunciou seu novo jogo, Baldur’s Gate 3. O jogo adotaria o mesmo modelo de desenvolvimento de Divinity 2, com um lançamento do primeiro ato em acesso antecipado no ano seguinte, e um lançamento final indefinido.

Começa o desenvolvimento: Entre elogios e críticas

Trailer de anúncio de Baldur’s Gate 3.

Conforme foram saindo os primeiros trailers de gameplay, muitos jogadores começaram a elogiar a qualidade dos gráficos, das interações entre personagens, e o quão fiel estava a jogabilidade ao RPG de mesa. Entretanto, um pequeno grupo de fãs dos dois primeiros jogos não estava tão contente, alegando que o jogo estaria usando o nome Baldur’s Gate apenas para marketing, parecendo mais um Divinity: Original Sin no universo Dungeons and Dragons do que uma sequência da série da Bioware.

Alguns dos principais motivos que desapontaram alguns desses fãs foram o combate em turnos, abandonando o antigo combate em tempo real com pausa, o uso do motor gráfico de Divinity: Original Sin, que deixou a aparência próxima ao jogo anterior da Larian nos primeiros trailers, e os novos personagens, abandonando a trama do Bhaalspawn seguida nos títulos da Bioware.

Primeiro trailer de gameplay de Baldur’s Gate 3.

Mesmo assim, a positividade em torno do jogo era muito superior ao descontentamento de alguns membros da velha guarda. Dessa forma, o acesso antecipado do jogo já foi um sucesso, vendendo cerca de 2,5 milhões de cópias até o lançamento final. Além disso, conforme o jogo foi sendo polido, as reclamações foram progressivamente diminuindo.

Entretanto, a Larian não contava com a pandemia mundial do coronavírus, e o desenvolvimento de Baldur’s Gate 3 acabou atrasando por conta disso. Após o lançamento em acesso antecipado no final de 2020, a ideia seria concluir o desenvolvimento em um ano. Porém, com a pandemia e os altos critérios do estúdio, o tempo de desenvolvimento acabou triplicando, com a versão final sendo lançada em agosto de 2023.

Sucesso explosivo: Baldur’s Gate 3 é lançado

Trailer de lançamento de Baldur’s Gate 3.

Dado o atraso no desenvolvimento, poderia se esperar que o hype do jogo tivesse passado, resultando em baixos números de venda no lançamento final. Entretanto, o que aconteceu foi o completo oposto, com Baldur’s Gate 3 se tornando um fenômeno estrondoso na indústria de jogos.

Logo no lançamento, o jogo já demonstrou o seu tamanho, alcançando cerca de 900.000 jogadores simultâneos na plataforma Steam. Para se ter uma noção, o jogo anterior da Larian, Divinity 2, teve um pico máximo de 90.000 jogadores simultâneos. Assim, além de multiplicar por dez o número do estúdio, Baldur’s Gate 3 se tornou o décimo jogo com maior número de jogadores ao mesmo tempo na Steam.

Entretanto, esse número não necessariamente define o sucesso final de um jogo. Cyberpunk 2077, por exemplo, alcançou mais de um milhão de jogadores simultâneos em seu lançamento, apenas para cair para picos de cerca de 20.000 jogadores só três meses depois, devido a suas polêmicas. Mas este não foi o caso com Baldur’s Gate 3. Mesmo meio ano após o seu lançamento, o RPG da Larian continuou alcançando picos de 200 a 300 mil jogadores simultâneos, com uma média total de mais de 600.000 jogadores por dia. Lembrando que estes dados se referem apenas ao PC, sendo que BG3 também recebeu versões para consoles.

Além disso, o jogo de Dungeons and Dragons obteve 95,92% de aprovação nas avaliações dos jogadores na Steam. Novamente, muitos poderiam contestar esse dado por não necessariamente representar todos os jogadores, mas acontece que Baldur’s Gate 3 teve mais de 600.000 análises, se tornando o oitavo jogo com mais avaliações na plataforma. Assim, fica muito difícil negar o absoluto sucesso alcançado pela Larian com o jogo.

Mas não foram só os jogadores que aprovaram Baldur’s Gate 3. A crítica também aclamou o trabalho da Larian, resultando em uma nota média de 96 no Metacritic, baseada em 119 avaliações da mídia especializada.

Trailer com elogios da crítica.

O jogo e o estúdio também receberam diversos prêmios, incluindo de jogo do ano no prestigiado The Game Awards. Mais recentemente, o jogo recebeu o mesmo título no DICE Awards, da Academia de Artes e Ciências Interativas, com votação de 30.000 veteranos da indústria. No mesmo evento, a Larian ainda recebeu mais 4 prêmios. Com isso, Baldur’s Gate 3 se tornou o primeiro jogo a ser escolhido como jogo do ano nas cinco principais premiações, que além das já citadas incluem BAFTA, Golden Joystick e GDC.

Baldur’s Gate 3 ganha o prêmio de jogo do ano no The Game Awards 2023.

Finalmente, muitos podem ficar interessados no lucro gerado pelo jogo. Afinal de contas, mesmo que a sua popularidade seja grande, estima-se que o orçamento de produção de Baldur’s Gate 3 tenha sido na casa dos US$ 100 milhões, valor que chega próximo ao de muitos filmes de Hollywood. Assim, não bastaria o jogo ser popular e bem-recebido para gerar lucro.

Pois bem, podem se tranquilizar, pois ao fim de 2023, Baldur’s Gate 3 já havia gerado US$ 657 milhões em vendas somente da Steam, sem contar vendas nos consoles e por terceiros. Atualmente, esse valor pode ter se tornado muito maior, e a Hasbro, marca-mãe da Wizards of the Coast, revelou ter lucrado US$ 90 milhões com a licença de Dungeons and Dragons do jogo até fevereiro de 2024. O número estimado de unidades vendidas já passa de 15 milhões, o dobro do número alcançado por Divinity 2.

Entendendo o Fenômeno: Os Fatores do Sucesso de BG3

Os atores principais dos filmes de Senhor dos Anéis em vídeo promocional de BG3.

Mas como Baldur’s Gate 3 conseguiu tamanho sucesso? Afinal de contas, o jogo era a sequência de uma franquia deixada de lado há vinte anos, cujos jogos haviam vendido pouco mais de 2 milhões de unidades cada.

Até mesmo Swen Vincke, fundador e CEO da Larian e diretor de Baldur’s Gate 3, chegou a pensar que o jogo não venderia muito mais após o fim do período de acesso antecipado. Em entrevista, o diretor belga afirmou que esperava no máximo 100 mil jogadores simultâneos na data de lançamento, previsão que, como já vimos, foi completamente superada.

Um dos fatores mais óbvios do sucesso do jogo foi o já citado aumento de popularidade do RPG de mesa que iniciou durante a década passada, e só segue aumentando. Stranger Things seguiu fazendo novas referências ao jogo ao longo de suas novas temporadas, cada vez mais populares. Critical Role também continuou se popularizando, e começou a receber apoio direto da Wizards of the Coast.

E não foi só nos Estados Unidos que Dungeons and Dragons recebeu exposição. No Brasil, por exemplo, o site Jovem Nerd iniciou uma saga de podcasts do jogo em 2011, o Nerdcast de RPG, que encontrou grande acolhimento da comunidade e segue até os dias de hoje. Além disso, outros influenciadores também encontraram sucesso com RPG de mesa, como é o caso de Cellbit, que mesmo jogando outra franquia de RPG, acabou de certa forma ajudando na disseminação do hobby.

Também não podemos deixar de mencionar o filme de Dungeons and Dragons lançado em 2023, com o subtítulo “Honra Entre Rebeldes”. Embora o longa-metragem não tenha arrecadado tanto nos cinemas quanto o esperado, ele recebeu ótimas críticas pelo seu respeito ao material original e pela captura do sentimento de jogar com os amigos. Assim, ao ser lançado apenas meses antes de Baldur’s Gate 3, “Honra Entre Rebeldes” também fez sua parte em difundir a franquia.

Trailer oficial do filme Dungeons and Dragons: Honra Entre Rebeldes.

Entretanto, a exposição da marca não seria sozinha capaz de criar o sucesso de BG3. É aí que entram a qualidade do jogo e os méritos da Larian. Diferentemente da maioria dos títulos da renascença dos CRPGs, que tentaram resgatar a complexidade e a estética do gênero, Baldur’s Gate 3 se focou em evoluí-lo, tanto em quesitos técnicos quanto de acessibilidade.

Com isso, a Larian trouxe o primeiro CRPG de nível AAA (ou Triple-A, termo para jogos de maior orçamento). Onde seus antecessores usavam um ângulo de visão superior distante para esconder os gráficos mais simples, Baldur’s Gate 3 trouxe visuais fotorrealistas de tirar o fôlego e fazer as placas de vídeo mais fracas suarem. Já onde os CRPGs usavam parágrafos e mais parágrafos de texto para descrever cenas e diálogos, a Larian trouxe mais de 140 horas de cenas cinematográficas completamente animadas e dubladas, incluindo inúmeras bifurcações baseadas em escolhas do jogador.

Baldur's Gate 3 trouxe gráficos cinematográficos.
Baldur’s Gate 3 trouxe gráficos cinematográficos – Foto: Steam

Por fim, onde alguns CRPGs anteriores permitiam o desenvolvimento de uma historinha amorosa com alguns poucos NPCs com alguns diálogos a mais, a Larian trouxe a opção de histórias completas de romance com todos os possíveis membros do grupo, independente de gênero, incluindo até mesmo, sim, cenas de sexo.

Assim, Baldur’s Gate 3 é claramente o jogo que chegou mais próximo de adaptar completamente a experiência de Dungeons and Dragons. Um mundo enorme, cheio de possibilidades que dá aos jogadores a liberdade para moldar a trama com suas escolhas. Isso, unido à sua apresentação cinematográfica, tornou fácil interessar até mesmo o jogador mais casual.

Adaptando Dungeons and Dragons: Acessibilidade sem perder profundidade

Baldur's Gate 3 utiliza a quinta edição do sistema Dungeons and Dragons.
Baldur’s Gate 3 utiliza a quinta edição do sistema Dungeons and Dragons – Foto: Steam

Mas é aí que relembramos um problema existente nos Baldur’s Gate anteriores: o uso das regras de Dungeons and Dragons. A quinta edição do RPG de mesa foi bastante simplificada, o que resultou num aumento de acessibilidade, mas ainda assim o jogo se manteve cheio de números, podendo afastar o grande público. Swen chegou a contar que um dos seus maiores medos antes do lançamento era que a complexidade do sistema pudesse afastar os jogadores.

Assim, isso só eleva ainda mais o trabalho feito pela Larian para simplificar o sistema e deixá-lo claro e acessível para a maioria dos jogadores. Diversos elementos foram pensados para alcançar este objetivo, que resultaram em uma interface completamente intuitiva e autoexplicativa.

Outros dois pontos que aumentaram a acessibilidade foram o já mencionado lançamento para consoles e a localização para 15 idiomas diferentes, incluindo o português brasileiro. Inicialmente, não havia planos para uma versão em português, mas após inúmeros pedidos nos fóruns da Steam e o sucesso de uma tradução de fãs do jogo anterior da Larian, o estúdio decidiu incluir o idioma no lançamento completo do jogo, conforme discutimos neste artigo em inglês. Muitas desenvolvedoras ainda são relutantes em se preocupar com a localização de seus jogos para muitos idiomas, e acabam perdendo muito mercado em potencial por isso. Baldur’s Gate 3 não poderia se dar a esse luxo, sendo um jogo com tanto foco na história e nos diálogos

Entretanto, ao buscar maior acessibilidade, muitas desenvolvedoras acabam também removendo de seus jogos muitas funcionalidades importantes. Isso acaba resultando em experiências menos profundas que não trazem satisfação aos jogadores mais dedicados.

Por isso, um ponto muito importante do sucesso de BG3 é que a Larian não removeu a complexidade e profundidade do sistema para deixá-lo acessível. O jogo ainda mantém a complexidade de cálculos do sistema de D&D nas suas camadas mais internas, além da profundidade de escolhas e possibilidades na história e na construção de personagens. Com isso, ele atinge um equilíbrio entre acessibilidade para novatos e jogadores que não querem se aprofundar em seus sistemas, e profundidade para jogadores experientes que quiserem passar uma infinidade de horas testando as inúmeras possibilidades.

O jogo trouxe a profundidade de D&D de forma acessível
O jogo trouxe a profundidade de D&D de forma acessível – Foto: Steam

Acompanhado disso, também é necessário reiterar a quantidade enorme de conteúdo que Baldur’s Gate 3 trouxe em seu lançamento, sem nenhuma DLC. Isso foi mais um fator que cativou os jogadores, ainda mais em uma era como a atual em que tantos jogos são lançados inacabados, com muitas DLCs e repletos de problemas.

Conclusão e o Futuro da Larian e de Baldur’s Gate

Animação comemorativa do lançamento de Baldur’s Gate 3.

Nesse momento, nos aproximamos do aniversário de um ano de lançamento de Baldur’s Gate 3, e o jogo continua com bons números, ganhando prêmios e sendo discutido pela indústria, crítica e jogadores. E esse sucesso todo não foi à toa ou um acidente.

Como vimos, seu sucesso foi o resultado de inúmeros fatores ao longo do tempo, e isso torna-o difícil de ser reproduzido. Entretanto, um dos principais pontos foi o trabalho bem executado da Larian, e este deixa muitas lições importantes que publishers e estúdios deveriam levar em consideração no futuro de suas produções.

Entretanto, muitos jogadores já estão interessados no futuro da franquia e da Larian, com a esperança do lançamento de expansões, ou até mesmo do anúncio da produção de uma sequência. Infelizmente, para estes, a Larian já anunciou que seguirá o mesmo caminho da Bioware, e não produzirá mais nada no mundo de Dungeons and Dragons. Ainda assim, para quem quer algo parecido sem se importar com a licença de D&D, a empresa também anunciou já ter começado a produção de dois novos RPGs com o mesmo nível de escopo. Além disso, a Wizards of the Coast também já anunciou ter começado discussões internas sobre o desenvolvimento de novos títulos de Baldur’s Gate com outros desenvolvedores.

Dessa forma, só nos resta esperar para ver se as empresas conseguirão reproduzir o sucesso e a qualidade de BG3, e torcer para dessa vez não demorar 23 anos. De qualquer forma, no meio-tempo poderemos nos aventurar inúmeras vezes por Baldur’s Gate 3, se quisermos chegar perto de explorar todas as suas possibilidades. Afinal de contas, até hoje existem pessoas que seguem rejogando os dois primeiros títulos da série desde que foram lançados, e continuam encontrando novidades para se impressionar.

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